sexta-feira, 9 de novembro de 2007

A Dieta de Úrsula

Tome partido. Neutralidade ajuda o opressor, nunca a vítima. Silêncio encoraja o torturador, nunca o torturado.
Elie Wiesel

Úrsula era ansiosa. Sabia que o verão se aproximava e que não estava em forma. Com uns quilinhos a mais, sonhou dias e dias com a dieta perfeita. Essa semana resolveu ir ao médico. Trêmula, nitidamente apreensiva, só tinha um único objetivo em sua mente: um remédio de tarja preta.
Chegou o dia. No consultório, a espera matava Úrsula. Ela estava inquieta e não conseguia posição confortável na cadeira. Mexia para um lado e para o outro, ajeitava o vestido, passava os dedos entre o cabelo, olhava para o nada. Os minutos não passavam. O médico se atrasara. “Cadê esse, puto?”, pensou. E nada do médico chegar. Até que ele chegou. Úrsula era a primeira da lista de espera. Sem titubear, levantou-se e ficou fitando a porta do consultório como uma cadelinha que olha o frango no espeto da padaria. Era chegada a sua hora. Hora boa. Distraidamente, ela entra e deixa a porta aberta...
- Bom dia.
- Bom dia, doutor - responde calmamente.
- Úrsula é o seu nome, não é?
- Sim, é.
- Pois bem, Úrsula, conte-me o que lhe aflige...
- Então, doutor, estou muito acima do meu peso e gostaria de um remédio que pudesse ajudar a moderar o meu apetite...
- Você tem muita fome, Úrsula?
- Sim, bastante. Pareço uma vaca no seu último dia de vida – descontraídos, os dois riram.
- Mas acredito que com uma dieta, você consiga o peso desejado.
- Não, doutor, o sr. não está me entendendo, quero um remédio que modere meu apetite. Preciso de um! Não posso me controlar nesse momento...
- Mas com uma dieta equilibrada, Úrsula, você vai conseguir – a longo prazo – os resultados que espera. Mas é preciso, também, fazer exercícios. Você faz exercícios?
- Sim, doutor, pratico natação no meu condomínio. Mas puxar ferro? Isso eu não faço não.
- Tudo bem, Úrsula, praticar esportes é muito importante...e esse já é um começo. Vou fazer uma dieta agora para você.
Nesse momento, o médico voltou-se para o computador e começou a redigir a receita com a dieta. Úrsula, inconsolada, na sua última tentativa pergunta – nitidamente – sem paciência:
- Mas, doutor, e o remédio?
- Sem remédios, Úrsula! Sem remédios...
Louca, ela grita e gesticula de forma agressiva: então, doutor, e o que faço com o biquini que comprei pra esse verão? Faço o quê? Enfio no seu cú?
O médico fica estático, sem querer acreditar no que vê e escuta. Ela continua.
- E a casa em Angra que aluguei, hein, hein? Como fica?
- E o dinamarquês que vem me comer? Isso o sr. não pensou, né, não? Passa logo essa porra de remédio a-g-o-r-a!
- Calma, sra. Úrsula...calma!
- Que calma o quê?!
Nisso, Úrsula visualiza onde estão as guias azuis sob a mesa. Fita seu objetivo de desejo como se sua vida dependesse de uma única cor, a azul. E num ato impensado, ela levanta bruscamente, pega o talão de receitas, e sai correndo do consultório para nunca mais voltar.
(Adriana Schimit)

*
Este blog adverte: o nome é fictício, mas a história pode ser real.

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Música do blog de hoje: Jamie Cullum – "High And Dry".

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5 comentários:

Anônimo disse...

Amei...
P.S.

Anônimo disse...

Don't leave me high, don't leave me dry...
I never have fear!
Love,
Ur.

Anônimo disse...

menina!!!! vc é a úrsula??? que bafão!!! ahahahahhaha, só falta!

Anônimo disse...

Posso sugerir a continuação da estoria?
Em posse daquele caderninho azul precioso e de um modelo de carimbo medico copiado, Ursula, antes uma escrava da ditadura da balança se transforma numa bem sucedida gestora/provedora de medicamentos milagrosos moderadores de apetite. Ela rapidamente ganha fama no submundo das gordas e pseudogordas(modelos) e se torna uma................... (agora eh com vc...hehehe)

Beijocas

Anônimo disse...

Hilária!!!!
Seu blog é ótimo!!!
Bjs Tati!!!!